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Conversas de Adega 

 

Os serões na adega são em frente ao televisor, ou à mesa da cozinha jogando uma sueca - “perdidos à rua, outros dentro! Mais um cal'zinho d'aguardente e uns figos passados para enchugar”. E assim se vai passando os dias na Ponta da Ilha, onde, esta semana não pára de chuviscar para atrasar as vindimas.

Há dias li que as vindimas no Pico começaram sexta-feira. A notícia foi da agência LUSA. Fartei-me de rir com a precisão do dia, como se tivesse havido um decreto de uma entidade qualquer a ordenar essa tarefa que varia de lugar para lugar e tem a ver com o amadurecimento das uvas, o estado dos terrenos, alagados ou enxutos, com a disponibilidade das pessoas, eu sei lá, com um sem número de contingências pois o homem põe e Deus dispõe.

Há quinze dias, quando o Manuel Raulino ia levantar parte da vinha do meu irmão, chegou à conclusão que a uva já estava a modos de apanhar, e assim fez. Só um ingnorante, como eu, julga que isto da viticultura, é tudo igual: na Madalena, em São Roque, na Ponta da Ilha ou no Calhau da Ponta. Nada mais errado. Houve quem sulfatou em março e teve muita uva e quem trabalhou as vinhas com o maior cuidado e não teve nada, nem um cachinho para provar.

Isto das uvas é como no vinho. Há quem lave e enxofre as barricas, convenientemente, e há quem prefira as culas de inox, lavadas com um pouco de água. No fim, uns tem vinho de boa qualidade que delicia os anjos, outros chega-se a março e já o bebem avinagrado...

Antigamente, tudo passava pelos balseiros e pelos lagares de madeira. Cada adega à dimensão da produção, tinha o seu, lavado e revisto, com todo o cuidado, dias antes da vindima, para não se dar o caso de derramar o vinho. Os proprietários orgulhavam-se desses equipamentos feitos com madeiras de qualidade para suportar o esforço da produção de milhares de litros do saboroso néctar do Pico.

Com o passar dos anos, a madeira foi substituída pela firmeza do cimento que, dificilmente, abre fendas.

Hoje em dia, os mecanismos da produção são ainda mais eficazes e rápidos. As trituradoras elétricas e as prensas mecânicas despacham uma vindima em poucas horas não sem antes se medir a graduação do mosto para ajudar a fermentação com as quantidades convenientes de açúcar ou outros aditivos que conservam o vinho de cheiro e lhe dão um sabor muito apreciado porque inegualável.

Muitos dos nossos visitantes desconhecem o vinho de cheiro do Pico, produzido em pequenos currais que constituem não só a paisagem da vinha, consagrada pela UNESCO e muitas outras zonas vinícolas ao redor da ilha.

Poucos, muito poucos são os restaurantes que o incluem nas suas ementas ou fazem a sua promoção. Alguns vendem-no como vinho da casa, e não cuidam de apresentar o bom vinho do Pico. E é pena.

Nesta época estival em que muitos turistas andam por aqui, inebriados pelo aroma das uvas, das árvores e dos milheirais, seria do máximo interesse que as adegas com seus lagares mantivessem portas abertas, as casas de pasto mostrassem suas atafonas e alguém lhes explicasse como era feita, em tempos não muito recuados, a fabricação do vinho e da farinha.

Há muito mais a ver no Pico que o whale-watching e o Museu dos Baleeiros, a paisagem da vinha, as grutas subterrâneas, a natureza e o ambiente que nos envolvem.

O turista quer também saber como sobreviveu esta gente antes da era industrial, que instrumentos utilizava para fazer a roupa, o pão e o vinho.

Os muito poucos moinhos que ainda se conservam, deveriam estar abertos, como acontece noutras paragens, bem como as atafonas – quase todas as casas de lavradores as tinham -  e os lagares das adegas que ainda os conservam.

Isto acompanhado de uma prova das nossas bebidas tradicionais e de doces caseiros, ajudaria a promover os nossos produtos típicos que qualquer visitante não rejeita.

Por aqui, ainda se oferece um cacho de uvas, um copo de vinho mosto ou um cal'zinho d'aguardente ou de angelica.

Vai um copito? Olhe que é do Pico. É bom!...

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